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sexta-feira, junho 14, 2019

Gustavos

Niterói - 15 de maio de 2016

Hoje conhecemos o Gustavo, que aos 13 anos passava a noite, que deveria ser numa cama, na porta de uma loja de conveniência de posto. Gustavo foi arredio, como 
quem não precisasse de conversas àquela hora - e não precisava mesmo, era a gente que precisava. Perguntei se Gustavo estava com fome e se queria algo pra comer, e ele, contrariando todos os gostos dos meninos de 13 anos, me disse que não.
Insistimos, sentamos ao seu lado e fizemos perguntas, idiotas para quem conhece a realidade, mas tão amargas para nós que tivemos sempre tudo.
- Você estuda?
- Não
- Você tem irmãos?
- 7
- Eles estão na escola?
- Só as duas mais novas.
O papo seguiu, e Gustavo, sem paciência, nos explicou sua dura realidade, como quem tivesse explicando pela enésima vez uma conta de somar a uma criança.
É tão simples a dureza pra você Gustavo, mas nos perdoe a ignorância de não saber nada das ruas. Nada da luta de uma família que sobrevive, apenas.
Gustavo queria voltar a estudar, mas sua mãe perdeu os documentos e ele tem que ajudar na renda.
Gustavo gosta de jogar futebol e soltar pipa, mas tem que ajudar na renda.
Gustavo só queria ser um menino de 13 anos, mas tem que ajudar na renda.
Gustavo cansou das perguntas chatas, se despediu e foi encontrar a mãe, que dormia ali perto.
Gustavo tem que voltar pra casa da tia amanhã, em Caxias, para levar um dinheiro pra ajudar na carne.
Gustavo foi embora, nos achando tolos por beber até a madrugada e indagar a crianças sofridas o óbvio.
Gustavo levou um chocolate e prometeu dividir com os irmãos se eles estivessem acordados, caso contrário comeria todo sozinho.
Gustavo não sabe o que quer ser quando crescer.
Gustavo não tinha fome.
Não de comida.
Mas ele não tem tempo, tem que ajudar na renda, porque as irmãs o esperam e o movimento domingo no sinal é fraco.
Nos despedimos falando para que o Gustavo voltasse a estudar, ele apenas sorriu e foi embora, concluindo que nós não fôssemos entender mesmo o sistema.
E não entendemos. 

Desculpa Gustavo, mas nós não entendemos.

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