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domingo, março 31, 2013

Sem título




Eu fui querendo que você me pedisse para ficar
Que me fizesse voltar e implorasse abraços
Ou quisesse amar e tirar do peito o cansaço
Desse coração tão cheio de estilhaços

Eu fui me afastando aos poucos
Jurando por algum santo louco que não voltava mais
Fui num barco sem rumo, esperando encontrar um cais
Mas em meio ao mar revolto achei motivos pra voltar atrás

Pedi desculpas pro santo, esqueci todo antigo pranto e disse: mais uma vez
Quis uma vodca forte, que me desse um norte e uma leve embriaguez
E na contramão da vida quis achar paz nos braços do moço que apraz 

Mas a vida não anda ao avesso
E nos braços daquele rapaz que eu não mais mereço
Me despeço, desfaço os planos e sopro um expresso.

segunda-feira, março 18, 2013

Folhetim



Se eu pudesse escolher, você não mexeria tanto comigo. Você não provocaria tantos arrepios pouco conhecidos por mim.
Se eu soubesse que teria fim eu não deixaria que sua barba encontrasse minha nuca daquela vez, ou, se eu soubesse que teria fim eu não esperaria tanto para que sua barba encontrasse minha nuca, assim.
Se eu soubesse andar sem que meu corpo sentisse saudades do seu, eu não correria tanto em um caminho sem fim.
Se eu pudesse te mostrar o quanto meu corpo grita, o quanto ele se agita quando você se aproxima, não demoraria tanto pra chegar até mim.
Se o mundo soubesse de como nossa respiração se ofega, do quanto nossa cabeça nega, mas o corpo não, eles tocariam nosso amor no bandolim.
Se eu pudesse contar sobre como minha perna bamba, quando a gente se ama, de como minha voz geme enquanto seu corpo treme, era manchete no Pasquim.
Se eu conseguisse a gente se bastava pela última vez, se amava mais uma vez e guardava na garganta o sabor do fim.
Mas suspeito que ainda assim,
te procuraria pelos botequins
e imploraria aos querubins para que o seu não sei virasse sim.

sábado, março 09, 2013

50 tons de liberdade (feminina)




Há meses entro em conversas polêmicas sobre algemas, sexo e Christian Grey com homens e mulheres que leram ou não a trilogia mais famosa de 2012. Confesso que esperei passar o boom do 50 Tons de Cinza para escrever sobre, e aproveito o gancho da semana do Dia Internacional da Mulher para falar fazê-lo.
Li apenas o primeiro livro, muito mais pelo sucesso que ele fazia que pela vontade de lê-lo, furei a extensa fila de livros para entender do que tanto se comentavam. Deparei-me com uma leitura simples e cheia de clichê, com personagens que na vida real seriam bem difíceis de encontrar. Não devorei as páginas do voraz romance entre a jovem virgem e o rico e belo Grey. Li, na velocidade com que leio qualquer livro, e ainda achei que o final “do nada” do primeiro livro uma grande sacada de vendas para o segundo, como uma novela de sábado que termina com um suspense para que você não deixe de assisti-la na segunda feira.
Independente do grau de experiência sexual da leitora, é sim uma estória que te deixa encabulada, em muitos momentos. Todos os detalhes nos fazem viajar pelo corpo do empresário bem sucedido e cheio de tesão, mas funciona quase como uma fábula. Ter um Christian Grey na vida real pode ser bem menos prazeroso que ler sobre ele, tal como seria um grande episódio de loucura presenciar um príncipe conversar com uma raposa. Tem coisas que só funcionam no mundo da fantasia, e esse romance entra no mesmo hall dos contos de fadas, dos filmes de vampiros e seriados de zumbi.
Ninguém quer no mundo real caçar vampiros, voar na vassoura do Harry Potter ou ver a abóbora virar carruagem. E isso nunca nos impediu de, ainda que não fizesse parte do nosso mundo, gostar e tirar lições dessas estórias.
Defendo aqui, o livre direito das pessoas terem gostado do livro mesmo sem querer entrar em um quarto vermelho da dor. O livro traz lições nas entrelinhas. Nos identificamos com a Anastasia Steele porque, tenho certeza, pelo menos uma vez na vida já vivemos o dilema do amor e da dor no mesmo homem. TODAS nós já levamos “palmadas” de companheiro e ainda assim continuávamos nos apaixonando. Basta ver o quanto nós gostamos de homens cafajestes. Talvez o sexo violento do livro tenha nos lembrado que nosso processo de se apaixonar funciona do mesmo jeito “entre tapas e beijos”.
Por fim, embora seja para mim o ponto mais importante do sucesso do livro, estamos vivenciando uma das maiores demonstrações de quebra de paradigmas sexuais femininos. A nossa sociedade, que até 40 anos atrás a mulher era desonrada se não casasse virgem, está vendo mães, avós e filhas lerem um pornô em praça pública, sem o mínimo pudor. Gerações femininas da família comentam sobre sexo na mesa do almoço de domingo, usando o livro como ruptura desse tabu.
Entre as conversas sobre a trilogia, as mulheres estão falando sem medo suas preferências. Estão se permitindo experimentar um sexo diferente do papai e mamãe santo que os tradicionais falam.
Cada leitora desse livro é, provavelmente, menos uma mulher no mundo que vai morrer sem conhecer o orgasmo. Não porque o livro é a bíblia do sexo, mas porque ele provoca, ele deixa com a pulga atrás da orelha, ele mexe com a nossa libido e nos mostra prazeres de diferentes formas. Teremos mulheres mais satisfeitas, homem saciados, menos medo de tocar no assunto sexo dentro de casa, mais liberdade da mãe conversar com filha.
Se esquecermos toda desconfiança sobre a qualidade do livro, nos deparamos com mais de 50 tons de liberdade,  e ganhamos uma sociedade de cabeça menos fechada. Afinal, foi isso que esse século sempre prometeu.